Ver o nascer do sol a pedalar é um filme único e irrepetível, um privilégio para o rider e para a crew, por vezes com imagens tão bonitas que quase compensavam a falta de mais um par de horas de descanso. Quase… Para nós, ciclistas ou só seguidores e apreciadores desta história, existem imagens desta RAAM dos Portugueses que vão ficar gravadas na nossa memória.
Madrugaram para tentarem pedalar o maior número de horas possível sem o calor extremo que tinham sentido no dia anterior. Claro que o dia chegou e o calor confirmou-se. Voltaram a usar a técnica do colete e das meias ao pescoço com gelo, bisnagadas de água, muitos líquidos para hidratar e rolaram muitos quilómetros até que tiverem o primeiro furo neste percurso.
As rodas e os pneus da bicicleta do João são tubeless , ou seja, não têm câmara de ar, mas sim um líquido anti furos que é colocado entre a roda e o pneu, que fica selado depois com o enchimento de ar. Este sistema permite que na maioria dos casos em que aconteça um furo, o líquido atua como selante e não é necessário fazer reparações.
Mas não é um sistema à prova de todos os cacos de vidros e por isso por vezes, pode ser necessário trocar o pneu, como foi o caso neste dia.
A crew ainda tentou colocar mais líquido anti furo, mas perceberam rapidamente que não estava a resolver. Trocar um pneu leva o seu tempo, mesmo que seja alguém muito experiente e na RAAM todos os minutos a pedalar são valiosos, logo a solução que colocaram em prática foi retirarem a roda traseira da 2ª bicicleta que viaja no suporte do carro e colocaram-na na F16, a bicicleta principal do João.
A equipa também teve que seguir viagem, era o follow car que estava neste episódio. E foi aqui que entrou uma das armas secretas da crew Portuguesa: o desenrasca português. Os pneus novos para serem colocados, cedem melhor se forem ligeiramente aquecidos (técnica que o rider João Pombinho usa amiúde e até já escreveu um post sobre este tema aqui no Blog)…ora não havia forno, mas estavam mais de 30 graus de temperatura lá fora, de forma que o tablier do carro fez as vezes e aquece o pneu. Pneu antigo removido, novo colocado, líquido anti furo e ar e tudo isto em pleno andamento, atrás do rider. Top Crew, como já vamos estando habituados!
Entretanto um contacto com a Hammer trouxe mais uma boa novidade: tal como já tinham feito no início da prova, todos os suplementos adicionais que precisavam agora para continuarem até ao final da prova, seriam oferecidos pela Hammer USA ao João Pombinho. Apoio TOP! Combinaram um local de entrega num ponto do percurso para o próximo dia e estava mais um tema resolvido.
Neste dia parte do percurso foi feito numa estrada do tipo “auto-estrada” com 3 faixas de circulação, carros a passarem os ciclistas e os carros das crews a alta velocidade. Algo impensável cá em Portugal, mas a RAAM é (como o nome diz) na América, um “free country” e por isso eles são livres de definirem o percurso de bicicleta a passar nessa estrada de aceleras. Atenção redobrada do rider e da crew e sempre desejosos de terminarem aquela parte do trajeto.
E lá o terminaram e entraram noutra estrada de circulação mais calma, mas logo deram com outro fator de estranheza, porque nesta estrada apareceram animais “atropelados” a cada 200 mts (corvos, tatus, …), uma imagem que lhes causou muito incómodo e desconforto.
Quando o calor apertava e todos já acusavam alguma sonolência, decidiram fazer uma paragem para uma power nap, que são pequenas sestas de 20 a 25 minutos, para repor energias. A crew aproveita e recupera também.
De volta à estrada a crew continuou muito ativa a alimentar a curiosidade dos seguidores, não só continuando com as respostas às questões enviadas nos dias anteriores, mas também fazendo novos posts com o rider. E até o rider fez vídeos da perspetiva de quem pedala. Um dos posts deste dia revelou o “grito de guerra” da equipa:
Por nós
Por quem não pode
Por Portugal
De Oceanside até ao final!
Já de noite decidiram fazer uma paragem para comer e esticar as pernas e estando todos fora do carro ouviram barulhos vindos do mato, na sua direção. O episódio do urso ainda estava fresco na memória recente de alguns e sem saberem o que era (outro urso? uma cobra?), largaram tudo e meteram-se todos dentro do carro, rider incluído. A F16 ficou caída no chão lá fora…o João deve ter ficado preocupado! E era um tatu, que deve ter sido atraído pelo cheiro da comida e foi farejar por ali à procura de migalhas. Caso para dizer que era o Tatu-do-bem.
O dia tinha sido longo, o João pedalava já pela noite e faziam planos para chegarem ao ponto de encontro com a restante crew para descansarem. O follow car seguia atrás do rider e percebeu pela forma como ele estava a pedalar, pelos desvios da bicicleta, postura do corpo, cabecear…, que o João estava a ficar com muito sono e que seria arriscado continuar a pedalar.
Entre a crew e o João está combinado um sistema de cartões de aviso: cartão amarelo, para casos em que a crew se apercebe que o rider está a mostrar sinais de muito desgaste, e portanto, é avisado que poderá ter que parar; cartão vermelho, quando já passou o tempo do aviso e foram detetados sinais que indicam que é obrigatório parar de pedalar.
Este era um momento de cartão amarelo. A crew avançou com o carro, colocou-se ao lado do João de vidro aberto e antes que lhe dissessem alguma coisa, ele próprio disse: “self cartão amarelo”.
Bom saber que o João estava neste nível de consciência ao 8º dia da RAAM.
Pouco depois de passarem a TS# 34 (Washington, Missouri), com 3.263 km percorridos, pararam num alojamento para descansar, antecipando a pausa e respeitando o estado de cansaço que era partilhado por todos.
Mais um dia conquistado heróis!